segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

«Deixe-me ver a etiqueta do seu vestido.”

Noite de 27 para 28 de Março de 1999
O Luís vai dar uma aula. É uma aula ao ar livre e não é para médicos. Julgo que é uma aula para estudantes, ou candidatos a cursos de medicina. Parecem um grupo de excursionistas a passear por uma feira de cultura. Eu vou à frente do grupo e quero distanciar-me, mas não consigo, porque há muita gente atrás de mim e ao meu lado. Assim, a forma mais segura de caminhar é à frente do grupo, ligeiramente ao lado do Luís. E eu penso:
“Mas ele tem os pés tão pequenos”
E de repente ele fica tão bem disposto, mas tão bem disposto, que tudo aquilo se transforma numa brincadeira. [...]
Afasto-me.

E agora estou numa sala e para sair dessa sala é preciso passar por uma mulher que ocupa todo o espaço da passagem, porque está metida dentro de uma estrutura de carrinho de choque de feira popular. Está comigo uma amiga minha que conseguiu passar através das oscilações daquele carrinho com a mulher lá dentro. Eu já não consigo. Então fico na plataforma de borracha, a oscilar também de um lado para o outro, nas costas da mulher, até que ela me diz:
“Estou a ficar farta de tantas pessoas a tentarem passar-me à frente.”
E eu digo:
“Mas eu não tenho outra forma de sair daqui”.
E rio-me. E ela sabe que eu não me vou zangar, mas também não vou voltar as costas. Então diz:
“Está bem. Passe lá. Mas antes deixe-me ver a etiqueta do seu vestido.”
E eu tenho um vestido comprido, lindíssimo, preto, decotado nas costas, Max Mara. A mulher deixa-me passar por ela e depois agarra-me na etiqueta que estava nas costas do meu vestido, e lê, em voz alta e muito snob:
“Ah! Sthephen Kelian, logo vi. Só podia ser, é lindíssimo”.
E eu não digo nada, porque tanto faz, mas a etiqueta que ela refere é de sapatos italianos e não do meu vestido. A verdade é que o que eu quero mesmo é passar.

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