NOITE DE 7 PARA 8 DE NOVEMBRO DE 1995
Na Produtora. A entrada é diferente. As escadas são largas, de mármore, e digo, quando estou a subir, "que maravilha, as outras eram tão estreitinhas e tão íngremes, estavamos sempre a pensar que podíamos partir uma perna." Lá dentro está tudo muito diferente, mas continua a ser a mesma. Vou dar um beijinho à Paula e estendo-me sobre a secretária dela para dar um abraço á Tinucha.
O chão é de mármore raiado, lajes grandes e muito bonitas. O mobiliário é high teck, e há uma janela grande, com um parapeito cheio de vasos de sardinheiras, onde me encosto a olhar para a rua.
Volto-me para trás e vejo o Pedro que vem ter comigo, e dá-me um abraço, e ficamos a falar, à janela.Depois vejo o Jorge e peço-lhe autorização para utilizarmos imagens da produtora para fazer o spot , e ele diz que evidentemente, sem problema nenhum.
Depois vou a uma biblioteca que tem muitos , muitos, muitos andares. E quase todos são debaixo do chão. Estou no 5º ou 6º da cave, mas quero ir à "literatura das origens", mas informam-me que devo descer muito mais, ao mais fundo, e o mais fundo é aí o 47º andar inferior. Sinto muito calor, e aquele peso opressivo de quem está a entrar profundamente dentro da Terra, e sente o mundo inteiro por cima de si.
Saio no andar que marquei e que é o último, penso, e entro numa biblioteca muito bem arrumada, com livros muito bonitos que quero levar, e objectos de arqueologia fac-similada que também gostava de ter, e recordo-me das lojas dos bons museus, mais ou menos como no British, e pego em várias coisas, e então o senhor que toma conta da biblioteca diz-me para começar mesmo pelas origens, que neste caso são a Bíblia, e livros dos primeiros tempos da Era Cristã, o que me causa alguma estranheza, porque pensava que as origens eram muito mais recuadas.
Há um livro que abro e tem uma gravura muito bonita, e um tanto bizantina com alguns laivos de gótico, representando Jesus Cristo e o diabo, sob o fundo de uma Cruz radiante, e aquela gravura referia-se á Tentação.
Depois vou numa avião e o avião vai a sair de uma cidade capital, acho que é Berlim. Olho pela janela e digo às pessoas que o avião está a voltar para trás, está mesmo a voltar, e é um avião de 17 lugares.
Perde altura e começa a fazer-se à pista numa auto-estrada, porque nem tem tempo de chegar ao aeroporto. O piloto diz às pessoas que vai voltar para trás, mas isso não vai alterar em nada o destino do voo, e não é caso para alarme.
Vejo o avião aterrar na estrada, no meio dos automóveis que, por sorte, se desviam, mas a situação, embora perigosa, é estranhamente desprovida de perigo real. O sentimento é de frustração pelo tempo que se perde
Depois o avião volta outra vez a subir, porque na estrada de emergência não há combustível, e ele precisa absolutamente de combustível. Olho para cima e comando as operações, porque há fios de alta tensão e o avião pode destruir-se neles, e esse é na verdade um perigo grande. Agora estou sentada a cavalo no avião, cá fora, a levar com o vento e a minha carteira está em risco de me cair do ombro, e eu própria estou muito mal sentada, e tenho medo de não me conseguir aguentar e desprender-me e cair. Alguém me diz para curvar a cabeça e o pescoço de forma a não acometer o vento directamente, da mesma forma que nos sentamos para andar de mota, acomodando-nos ao vento e não contra ele. De modo que consigo endireitar a carteira, e arranjar uma posição muito mais segura, e agarrar-me bem. Só penso no horror que vai ser morrer congelada, quando o avião ganhar altura. Mas a mesma pessoa diz que não corro esse perigo. O avião agora só vai voar à altura que está, relativamente próximo de terra. De modo que não faz frio, não corro perigo, e posso olhar para baixo, e ver a terra verde e castanha dos campos arados e bem cultivados, a deslizar por baixo de mim.
E depois estou em terra, á entrada de uma loja de alta costura, onde exprimentei, há tempos, um casaco que não cheguei a comprar. Todas as pessoas estão a fazer compras. Eu não tenho dinheiro. Mas também não estou a ver nada que me agrade muito. Então pergunto à minha mãe se acha que eu posso fazer compras e apresentar a factura à companhia de aviação para me compensar pelosdanos causados pelo incómodo da interrupção da vaigem, em vez de ir para os jornais fazer queixas deles, e a mãe diz que é óbvio que devo fazer isso mesmo. Então é um stress, quero despachar-me a ver as coisas, mas não encontro nada que goste, e vou entrando e saindo de salas com roupas de toilete, que não me agradam, e, de sala em sala, agora já acompanhada por uma empregada que já conhecia de ter comprado ali outras coisas, encontro finalmente o meu casaco, que a vendedora me traz mais o chapéu, duas peças que eu tinha visto, gostado, e escolhido faz tempo. Mas é um chapéu preto e branco, cheio de penas, e já não gosto de me ver com ele. Penso: como é que vou apresentar a factura à companhia? Se peço à loja para lhes ir cobrar não deve ser muito fácil, porque não me conhecem, e estou num país que não é o meu.Se deixo as coisas para mas mandarem quando a companhia lhes pagar, arrisco-me a demorar a recebê-las. Para pagá-las eu e levá-las já não posso, não tenho dinheiro. Mas tenho cartão de crédito. E é assim que faço.
E depois estou num estúdio e vai-se fazer um filme e parece que eu entro, ou pertenço ali, e encontro (transcrição indecifrável e inacabada)
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