domingo, 8 de abril de 2007

Uma rua que desce até ao Cais do Sodré

NOITE DE 7 PARA 8 DE MARÇO DE 1997
Ouvi, distintamente, a voz de Joshua. Eu atendo o telefone e ele fala. Não consigo responder-lhe. Depois, ou antes, estou numa rua íngreme. É uma rua que desce até ao Cais do Sodré. Vou ter com um colega meu. Depois começa a chover. É uma chuva miudinha. Uma chuva molha-tolos. E quando chego ao Cais do Sodré resolvo voltar para trás porque não me quero molhar. As ruas estão desertas, ou pouco habitadas, são ruas de uma cidade que ainda está em construção. A meio caminho há um homem que se junta a mim, e é um homem de leis. É moreno e tem cabelo preto, liso. Gosto da companhia dele. Subitamente atravessa-nos à frente uma garotinha nua, com uma chupeta na boca e um boneco na mão. Parece abandonada, mas está a sorrir. E eu penso: será que vou ter de tomar conta dela? O homem agarra nela e avançamos uns metros, e ali há casas. São casas de pessoas modestas, uma espécie de ilhas. As mulheres têm aventais postos, e falam umas com as outras nos pátios comuns. Uma delas adianta-se. A criança é dela. Sinto um profundo alívio. O homem admoesta-a por ter descuidado a filha. A menina tem três anos, mas é tão pequena como um bebé de meses. No entanto parece saudável, porque é toda proporcionada. E mexe-se com alegria. Vai, pelo pé dela para dentro da sua casa. A mãe sorri, e torce o avental. E andamos mais. E agora ele tem o braço por cima do meu ombro. E a minha mão caída toca na dele, e ele agarra-me os dedos. Só a ponta dos dedos. É muito bom. Entramos para dentro de um hotel. Ele vive naquele hotel quando está em Lisboa. Vou para o quarto com ele e o quarto tem gente. Ele chama o empregado do Hotel e censura-o asperamente. Aquelas pessoas não deviam estar ali, diz ele. Ouve-se barulho, eles vêm a sair.
Como não quero que me vejam, afasto-me e entro dentro de um quarto que está em obras. É um quarto muito grande que faz um L, e tem móveis empilhados porque está em obras. E em cima de uma cómoda, que tem uma mesa de cabeceira por cima, espreitam revistas. E há dois pares de caixas de óculos, vazias. A porta do quarto é envidraçada, com vidros pequenos, biselados. O casal que saíu do quarto do homem desce por uma escada, em frente. A rapariga volta atrás para me ver. Ela aproxima-me, mas não muito. Não tenho a certeza se me consegue ver bem. Aliás é só nessa altura que percebo que a porta é envidraçada. Ouço-a rir enquanto se volta a reunir ao namorado, e desaparecem na curva da escada. Volto para junto do homem. O quarto é parecido com o outro. Também tem ar de quarto em obras. Faz um L. A minha cama é à entrada. Ele está no centro do quarto.

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