15 PARA 16 de JANEIRO DE 1995
Estou numa casa de dois andares e preciso de ir ao primeiro andar. É uma casa alegre, banhada de luz amarelada. Subo as escadas, mas a cada passo sinto uma dificuldade crescente. Há no ar uma vibração de medo que cresce de intensidade, e se enrola nos meus braços, nas minhas pernas, vestindo-me com um peso de chumbo que me aperta o coração.
O ar está carregado de electricidade. Tento ignorar o medo, mas quando estou perto da porta do quarto que quero abrir, a violência da sensação paralisa-me. Olho para baixo e grito pela minha mãe, mas o som que me sai do peito é baixo, rouco, tão pouco parecido com o grito que quero soltar dentro de mim. A minha mãe, contudo, ouve-me. E responde-me, cá de baixo, que naquele local sente precisamente o que eu sinto, e que ali deve haver alguma assombração, pelo que não devo estranhar o que estou a sentir.
Assumo o meu terror, e volto para trás, rapidamente, ganhando forças à medida que fujo. Começo a descer as escadas, o coração a sossegar no peito.
De repente olho para trás, para cima, e vejo-o. É ser velho pequeno, imundo, quase inofensivo, repulsivo, e no entanto, aterrador. Está vestido com uma túnica amarela, comprida, até aos pés. Tem um arremedo de barba e bigode. É ele que tenta subtrair-se ao meu olhar, escondendo-se nas dobras dos degraus, sempre atrás de mim. Reage com uma expressão de raiva à nossa troca de olhares que o põe a descoberto. Arreganha os dentes.
Mas eu já não o deixo fugir. Ao meu lado, a minha mãe dá-me amuletos para me proteger dele. Subo as escadas armada da minha raiva e destes amuletos quase infantis. Vou subindo enquanto ele se encolhe e recua, arreganhando os dentes e rosnando, e eu olho-o, e odeio-o e persigo-o, e penso, num canto assustado de mim, e se ele não fugir mais à minha frente?
Mas a raiva é maior, e eu vou subindo as escadas até que percebo que para além deste velho que rosna e recua, há muitas outras figuras que o rodeiam, escondidas nas sombras, e que começam a criar forma, e corpo e rosto, e então... reconheço-as. Vejo os seus rostos. Querem abraçar-me, eu liberto-me. Já não têm força.
Sou eu quem tem força, agora.
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